O Troféu Brasil de Atletismo, realizado em agosto último, foi a primeira grande competição que contou com o retorno de três dos cinco atletas suspensos no maior escândalo de doping do esporte. Bruno Lins e Lucimara Silvestre deram a volta por cima e conquistaram resultados expressivos, enquanto Luciana França, lesionada, não obteve êxito.
A punição de dois anos dada aos ex-integrantes da Rede Atletismo quase fez Lucimara desistir da carreira, colocou André Domingos na vida dos atletas e mostrou que o técnico Jayme Netto, banido por causa do escândalo, ainda possui influência entre eles.
O caso
Luciana França, Josiane Tito, Lucimara Silvestre, Bruno Lins e Jorge Célio Sena faziam parte da Rede Atletismo, forte equipe sediada em Presidente Prudente, interior de São PAulo. Na preparação para o Mundial de Berlim de 2009, todos foram pegos no exame antidoping para a substância EPO e punidos por 24 meses. Os técnicos Jayme Netto e Inaldo Senna admitiram culpa no caso e foram banidos do esporte.
Contraste
Durante o Troféu Brasil, em São Paulo, Lucimara Silvestre não aparentava qualquer abatimento pelo tempo fora das pistas. A recordista sul-americana do heptatlo conquistou sem grandes dificuldades o título, ainda que tenha sentido "falta de ritmo de competições". Em conversa com o ESPN.com.br, ela demonstrou muita confiança para as próximas competições e também para quebrar sua marca na prova do heptatlo, o que quase conseguiu em SP: alcançou 6.074 pontos, apenas 2 atrás de seu recorde. Questionada se a altitude de Guadalajara, local dos Jogos Pan-Americanos, poderia atrapalhá-la, a atleta respondeu, otimista: "Adoro altitude. Quando se está focado, isso não atrapalha."
Apesar da euforia, Lucimara quase abandonou o atletismo após o doping. Atual técnico da heptatleta, Dino Cintra de Aguiar disse que ela estava "meio que abandonada, voltaram as costas para ela". O treinador trabalha com Lucimara desde abril de 2011 e revelou tê-la encontrada "estagnada". "Ela estava pensando em parar", garantiu. "O doping foi um erro, uma besteira. É um baque", continuou Dino Cintra.
Enquanto isso, Bruno Lins Tenório teve um Troféu Brasil dos sonhos: ele conquistou o título nos 100 e nos 200 metros rasos, sendo que no último bateu o recorde da competição que pertencia a Robson Caetano desde 1989. Agora, a melhor marca é 20s16. Depois, no Mundial de Daegu, ele chegou à final dos 200 metros e terminou na sexta colocação; ele ficou ao lado de Usain Bolt na prova.
"É o melhor Troféu Brasil de toda a minha vida. Nunca tinha ganho os 100 metros. Dei um grande passo. Fica a felicidade por ter batido o recorde do Robson, é uma honra", afirmou Bruno Lins aoESPN.com.br. O atleta falou sobre o caso de doping e disse que o apoio de família e amigos foi importante para permanecer no atletismo. "Se meus amigos tivessem virado as costas, ficaria mal. Se minha família também, ficaria mal. Não tenho nenhum tipo de rancor", assegurou.
Já Luciana França não teve tanta sorte em São Paulo. Campeã dos 400 metros no Troféu Brasil de 2009, ela ficou de fora da final da prova neste ano por conta de uma lesão na virilha. Sobre o período afastada por causa do doping, Luciana revelou ter trabalhado como personal trainer e afirmou: "Morri por um mês. Depois, ressuscitei".
Josiane Tito estava inscrita para participar do principal torneio de atletismo do país nos 800 metros rasos, mas desistiu. Jorge Célio Sena não competiu.
André Domingos
Medalhista de prata no revezamento 4x100m nos Jogos Olímpicos de Sidney-2000, André Domingos tornou-se o mentor de Bruno Lins e Lucimara Silvestre. Após as conquistas no Troféu Brasil, os dois atletas agradeceram muito ao ex-velocista por todo o apoio dado durante o período de suspensão.
"Não tenho palavras para descrever o sentimento que sinto por ele: amigo, companheiro. Esteve ao nosso lado, nos deu força, acreditou em mim e na Lucimara", disse Bruno Lins. Lucimara, por exemplo, ousou em suas roupas para a competição em São Paulo, todas desenhadas por André Domingos. "Ela tem corpão, precisava dar uma inovada, algo diferente", explicou. "Ela voltou em grande estilo, apesar do doping."
O ex-velocista revelou que a heptatleta estava em situação complicadíssima quando resolveu ajudá-la. "Passou por dificuldades financeiras, não tinha onde morar, a família dela mora na roça. Ajudei porque ela é uma atleta diferenciada. Não vi o lado ruim, mas o doping serviu de lição", falou André Domingos.
Influência de Jayme Netto
A cena foi presenciada por poucos: depois de vencer a primeira semifinal dos 200 metros do Troféu Brasil e com novo recorde do Troféu Brasil, Bruno Lins recebeu uma ligação do ex-técnico Jayme Netto, banido do atletismo por causa do maior escândalo de doping do esporte.
Sua ex-companheira de Rede Atletismo Lucimara Silvestre foi até o local onde os atletas descansavam após a prova e deu o telefone celular a Bruno Lins, dizendo que era Jayme Netto, técnico de ambos até estourar o caso de doping.
Os dois principais nomes da antiga Rede Atletismo possuem grande apreço por Jayme Netto.
"Jayme foi um pai para a gente, e ainda é. A atitude que ele teve de dar a cara para bater, mesmo arriscando a profissão dele de fisioterapeuta... Apesar de não estar presente nos treinamentos, na pista, ele está no nosso coração, o carinho que a gente tem por ele é muito grande", afirmou o campeão dos 100 e dos 200 metros.
0 comentários:
Postar um comentário